terça-feira, 20 de novembro de 2007

Merda!



Era mentira, sabíamos. Estavamos, porém, todos lá e queriamos acreditar nela. Crer naqueles farsantes, naquelas situações meticulosamente planejadas para nos fazer rir, chorar, amedrontar, sonhar. Aqueles desconhecidos tinham-nos sido apresentados naquele mesmo dia e, no entanto, tomávamos como nossos seus desejos, angústias e trapalhadas. Por algumas horas todos esqueciamos que aquilo tudo que viamos era uma grande fraude e, assim como um amante que entrega-se ao objeto de sua adoração, saltamos sem pestanejar daquele precipício.
Era mentira, sabíamos. Mas cada detalhe ocultado era um oásis onde se abrigava a imaginação - nossa contribuição para que aquela presepada ganhasse ares de verdade, para que sobrevivesse a si própria e se eternizasse em nossas memórias. Assim como quando acordamos de um sonho e preenchemos os buracos corroidos pelo esquecimento com coisas alheias ao mesmo que jurávamos estar lá, preenchiamos a todo instante a ausência dos fatos com a liberdade de nossos anseios.
Era mentira, sabíamos. Todas aquelas pessoas, aqueles lugares, aquelas lágrimas, aqueles sorrisos, os gritos, o silêncio, as mortes, os nascimentos, enfim, tudo era tão real que, por um intervalo indizível de tempo, não eramos capazes de separar todas aquelas sensações de nossas próprias. Acompanhavamos tudo: dores e alegrias, derrotas e vitórias, não como um curioso que observa pela janela algo que lhe é alheio, mas como participantes. Era tarde, eramos parte daquilo. Aquela mentira, finalmente, fazia parte do que somos.
Ao final: luzes acesas; cortinas fechadas. Era mentira, sabíamos.

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